março 22, 2010

Hair

Quem apoia quem? Os cabelos no rosto ou o rosto nos cabelos? Não fazia diferença alguma naquele momento, usava seus cabelos como cortina, queria se esconder atrás deles e sumir do planeta. Como se os cabelos trouxessem um tipo de invisibilidade digna de super-heróis de quadrinhos.

Não era vergonha que sentia, era algo além disso. Além da vontade de não ter feito, da vontade de não ter dito, da vontade de não ter reagido. Era um querer não ter nascido, um querer nunca ter existido, nem pisado, nem feito, falado e reagido, na sua história de vida.

É impossível de viver sem fazer tudo isso, logo, queria não ter vivido. O arrependimento queimava mais as suas entranhas que todas as doses de vodka de procedência duvidosa que acabara de engolir. E os cabelos continuavam ali, moles e semi-oleosos na frente de seu rosto.

Não sabia mais o que fazer. A situação não poderia continuar daquela forma. As equações teriam que mudar, só assim os resultados teriam chances de serem diferentes. Por que precisava pensar no passado? Por que se sentia tão influenciada pela sua história? A bagagem que carregava não poderia pesar menos?

Suas costas carregavam tudo. E tudo que carregava eram mágoas, pesadas mágoas de uma única vida. Não podia se esconder daquilo que já tinha passado, seus cabelos poderiam ter o dobro do tamanho, e, ainda assim, não fariam esse trabalho. Cortinas, eram cortinas de um palco de teatro.

Mesmo que passasse o resto dos tempos sentada na coxia, isso não mudava o fato de ter ensaiado a peça mil vezes, e ter aprendido sobre cada personagem presente na trama. O passado estaria sempre impregnado em si, assim como os cabelos na sua cabeça.

Raspou-os. Mil motivos a levavam a se esconder, e um milhão a não se importar com tudo aquilo que tinha passado. Cortou tudo, talvez assim se sentisse livre.

2 comentários:

André Srur disse...

Raspo.
Mas me escondo antes.

Anônimo disse...

Que aflição desse texto, muito bom!

E esse título...